sexta-feira, 18 de abril de 2008

Muita Parra e Pouca Uva...

Dia 12 de Abril de 2008. A data estava decidida e, desta vez o número de inscritos superava o das caminhadas anteriores. Éramos 23 no total e a este número alargado não deverá ser alheio o entusiasmo das descrições dos participantes nas anteriores caminhadas e reconhecimentos.
Os dias que se antecederam tinham deixado a ameaça séria de chuva mas, mesmo assim, não houve desistências!
A data chegou finalmente e na véspera foi o habitual afadigar de última hora, com os preparativos - calçado, roupa, mochilas, bastão, material fotográfico e carro.
No Sábado a manhã despertou preguiçosamente sob um céu plúmbeo, confirmando pelo pior, as previsões meteorológicas, que davam como certa a ocorrência de aguaceiros e a descida de temperatura. Mesmo assim, o grupo acabou por se juntar, entusiasmado e, com pouco atraso partimos.
Chegados à Pena, alguns companheiros, desmotivados pelas condições meteorológicas e assustados com a rudeza do trilho naquelas condições, acharam que seria melhor só efectuarem uma das partes do percurso e, assim, foi necessário levar um dos carros até Covas do Rio, para providenciar o regresso, depois de cumprida a descida. Foi uma alteração de última hora, ao plano prévio da caminhada e que atrasou a partida.
Ficou decidido que a Volvo do Aurélio, por ser um carro muito espaçoso, ficaria em Covas do Rio à espera dos desistentes e, por isso, parti com ele por uma ligação em estradão florestal, tentando cumprir o percurso no mais curto espaço de tempo possível, para que a espera do resto do grupo na Pena, não produzisse mais efeitos desmobilizadores. A chuva não desarmava e o troço ficou escorregadio, ocasionando algumas “atravessadelas” dos carros.
Pouco depois estávamos em Covas do Rio e o stress já era notório em ambos. Para complicar as coisas, os acessos à povoação são demasiado estreitos, o que dificultou as manobras dos dois veículos, enormes para tão exíguos espaços e o Aurélio teve, ainda, a peregrina infelicidade de partir um retrovisor. As coisas estavam, decididamente, a correr mal! Ainda mal recompostos, regressámos à Pena, pelo mesmo trajecto, sempre em contra-relógio e disfarçando mal a irritação, por saber da espera do resto do grupo e por já ter havido prejuízos materiais, sempre indesejáveis e desanimadores.
Foi debaixo de aguaceiros intermitentes que chegámos à Pena. O grupo encontrava-se maioritariamente refugiado no aconchego precário da “Adega Típica” e, os poucos que se encontravam no exterior informaram-me que a maioria tinha desmobilizado e já não iria fazer o trilho a que nos propuséramos. Fiquei desiludido mas afirmei-me disposto a prosseguir, nem que fosse sozinho. O pequeno grupo que se encontrava no exterior da Adega pareceu querer acompanhar-me e o Veiga ainda foi à porta, tentar convencer os desistentes. As decisões de parte-a-parte pareceram-me tomadas, pelo que parti com um grupo, pequeno mas determinado. Estávamos atrasados e o tempo urgia.
Perto da saída da aldeia, ainda mais uns poucos reconsideraram e juntaram-se-nos. Formávamos agora, um grupo reduzido a menos de metade dos inicialmente inscritos, que se tinham deslocado à Pena para efectuar o “Caminho Onde o Morto Matou o Vivo”, mas parecia-me coeso, determinado e, sem dúvida, animado. Os aguaceiros continuavam a pontuar o dia e, já todos tínhamos percebido, por esta altura, que iríamos fazer a jornada naquelas condições adversas. Contudo, as gargalhadas e os remoques jocosos não deixaram de se fazer ouvir, animando-nos sempre ao longo de todo o trajecto.
No meio de grande algazarra e excitados com o desafio, alcançámos a fresta entre as fragas do Picoto. Aqui, a excitação do grupo deu lugar a exclamações da mais genuína estupefacção, perante o cenário ao mesmo tempo belo e assustador, que nos franqueava a passagem para o vale estreito, encaixado entre as rochas escarpadas.
Perante a perplexidade paralizadora de uns, já os mais destemidos se afoitavam na descida – cautelosos – com o Nelson, munido de câmara video montada em tripé armado, a pedir passagem a toda a gente: “- Deixem passar a reportagem…” dizia, sempre animado e divertido, evoluindo por aquele percurso íngreme e sinuoso, com uma facilidade e equilíbrio espantosos!
As chuvas intensas dos últimos dias faziam a ribeira da Pena gorgolejar da escarpa, num jorro caudaloso e ainda mais troante. O caminho estreito que nos conduzia ao fundo daquela fenda estava ainda mais difícil e o grupo ia descendo em fila-indiana, entre lamentos e exclamações que não conseguiam disfarçar o nervosismo e a tensão reinantes. A Odete revelava-se - surpreendentemente - uma caminheira ágil e destemida, concentrando em si, orgulhosamente e até com uma vaidade mal disfarçada mas plenamente justificada, as exclamações de espanto e encorajamento.
Apesar da tensão e do esforço todos eram unânimes nos elogios ao cenário deslumbrante, regozijando-se com a decisão de não se terem deixado intimidar pelos aguaceiros que, intermitentemente nos continuavam a fustigar. Aquela beleza surpreendentemente deslumbrante e escondida justificava, em pleno, o esforço e a tensão da descida temerosa.
No fundo da garganta, o terreno voltava a nivelar-se e o chão de rocha xistosa, ora grosseiramente lajeado, ora aguçado em lâminas inclinadas ou ainda em nodosas formações retorcidas, luzia perigosamente, no seu polimento secular, sob a água da chuva que escorria e tornava a progressão muito escorregadia e instável. As pequenas quedas e escorregões, embora e felizmente sem consequências graves, começaram a suceder-se, sempre aclamados pela gargalhada geral, tendo sido raros os que se conseguiram equilibrar sem experimentarem a rudeza do solo. As câmaras fotográficas e de video iam registando tudo freneticamente; até mesmo as quedas!...
Das encostas à nossa volta escorriam linhas brancas e espumosas de água, que se iam engrossando umas nas outras e às vezes desaguavam em cima do próprio trilho, como se de um leito fluvial se tratasse.
Finalmente Covas do Rio surgia à nossa frente e ao chegar à aldeia fizémos uma pequena pausa, para retemperar as forças para o regresso. Parte do grupo que tinha ficado na Pena juntou-se ali, a nós, para alguns minutos de convívio e troca de impressões, mas todos voltaram a regressar de carro, à excepção da Sandra, que mais uma vez, preferiu fazer - apenas - o regresso, juntando-se ao grupo dos indomáveis.
O regresso foi feito a bom ritmo, não tendo o grupo esmorecido na boa disposição e galhardia. O esforço e o cansaço iam-se revelando nas expressões mais carregadas de alguns rostos ou nos silêncios mais prolongados para recuperar a respiração, mas a subida final foi abordada de forma decidida e corajosa, por todos.
O rigor inclemente da sinuosidade íngreme voltava a exigir-nos esforço e concentração máximos mas, alcançada estoicamente a fresta de onde se avistava de novo a Pena e apesar dos rostos afogueados, dos peitos arquejantes e das pernas doridas de todos, o alarido rejubilante regressou ao grupo, que agora, só pensava no cabrito que o Sr. Alfredo tinha à nossa espera...

4 comentários:

ED disse...

Não é pròpriamente um comentário ao texto mas antes um pequeno aviso para quem estiver interessado.
Realiza-se no próximo dia 25,Domingo,o IV Percurso Pedestre Histórico-Cultural"Caminho dos Galegos"organizado pela Escola EB de Penalva,CM de Penalva do Castelo e pela Junta de Freguesia de Mareco.As inscrições limitadas fazem-se para o nº232640080 até 15 de Maio.A saída está marcada para as 9h da Junta de Mareco.Abaixo a ociosidade!Vamos bater perna como dizem os nossos irmãos brasileiros.E.J.

ED disse...

E acerca do passeio anterior,onde estão esses comentários?onde estão essas fotos?Apelava aos fotógrafos da equipa que deixassem aqui, para todos poderem recordar ,esse divertido e chuvoso dia. Não posso deixar de expressar os meus agadecimentos ao amigo Luís Correia pela gentileza que teve, para com alguns sortudos, entre os quais eu me incluo,de nos mostrar toda a beleza que encerra a aldeia de Drave perdida no mundo e esquecida das gentes.Fomos depois conduzidos até Gourim,pequeno lugarejo em ruínas em que apenas uma das casas possui estoicamente telhado para abrigar um casal de jovens hippies apostados num regresso ás origens, à Mãe Natureza,que gentilmente puzeram o seu "palácio"à disposição do grupo alegando que aquele era da "comunidade".Quanto à viagem essa foi um autêntico rally por montes e vales em estrada de terra batida,curvas e contracurvas pondo à prova veículo e condutor que se portou com autêntico sangue frio perante a estrada e o reboliço que ia dentro daquele jeep.Imaginem o que são cinco senhoras três das quais confortávelmente sentadas ao colo dos respectivos conjuges, no banco de trás,gritando desalmadamente ao aperceberem-se da perigosidade do caminho com aquelas características, sobranceiro a precipícios medonhos. Parabéns pois ao exímio condutor e brilhante veículo que aguentou tão dura prova.Aprovados!EJ.

krónica disse...

Também eu fui uma das contempladas para conhecer Drave e Gourim naquele passeio inesquecível de nove pessoas no jipe do Luís. Há muito tempo que não me divertia tanto!
Quero aproveitar, também, para dar os parabéns ao condutor...ao jipe também, claro! Mas penso que a maioria das pessoas, mesmo com um jipe daqueles, dificilmente se aventuraria a transportar 9 pessoas por estradas que, até a pé, são difíceis de fazer! São precisas "unhas"!! Parabéns Luís!
Como disse o Sr.Dr. Emídio: "Aprovados!"
Fico à espera de novas aventuras como esta!
Um beijinho

Célia Mateus disse...

Minha nossa, mas és guia ;)Agora fiquei co curiosidade de visitar e de comer o tal cabrito :)